28/10/2015

Barbear - Uma Arte Ancestral (Parte 2)


Quando o homem moderno se barbeia, é simplesmente uma coisa que ele faz para se preparar para o dia. Claro que tu podes sempre tentar desfrutar da melhor experiência possível, usares inúmeros materiais e aplicares diferentes técnicas, mas a maior parte dos homens não pensam muito neste tema. Simplesmente cuidam deles porque tem de ser!

Mas ao longo do tempo e cruzando diferentes culturas, fazer e aparar a barba, está carregado com um elevado significado cultural  para todos os homens. O acto de fazer a barba fez parte de muitos rituais de passagem em muitas culturas, foi por vezes associado a rituais religiosos e podia ser conotado a estatuto e ao poder.  
Hoje neste artigo, vamos explorar alguns dos significados culturais e religiosos sobre o barbear e os cuidados pessoais desde o inicio da história e  em todo o mundo. Se pensam que o homem hoje em dia é demasiado preocupado com a sua imagem, esperem até saberem das práticas dos nossos ancestrais. 

Antigos Egípcios


No inicio da civilização egípcia, os homens deixavam crescer as barbas juntamente com o cabelo. Os réis da época "cultivavam" as suas barbas e polvilhavam-na com ouro em pó. Alguns homens egípcios, como Rahotep, um oficial da terceira dinastia, até usaram imponentes bigodes, 



Mas o amor pela virilidade e por pêlos rapidamente se desvaneceu quando os homens egípcios se envolveram com a temática dos cuidados pessoais no inicio do período dinástico. Durante este tempo, os pêlos começaram a ser vistos como símbolos representativos das tendências animais do homem. Para meter o homem primário para detrás das costas e se tornarem civilizados, os homens egípcios começaram a remover todos os pêlos das suas cabeças, faces e até nos corpos. Homens egípcios ricos muitas vezes contratavam barbeiros a tempo inteiro para viverem com eles, de modo a poderem manter a sua pele limpa e suave todos os dias. Uma aparência com pêlos passou a ser sinal de baixo estatuto social.

De acordo com o historiador grego Herodotus, os padres egípcios rapavam todos os pêlos do seu corpo como parte de um ritual de limpeza. Até retiravam as sobrancelhas e as pestanas (Au!). Retirar pêlos era tão importante para os antigos egípcios que os reis mandavam os seus barbeiros fazerem-lhes a barba com lâminas incrustadas de jóias e até eram abençoadas! Quando um rei morria, muitas vezes era enterrado juntamente com um barbeiro e a sua lâmina de confiança para que pudesse ser barbeado após a vida.


Antiga Mesopotâmia 



Os homens antigos que viviam entre os rios Tigre e Eufrates dedicavam imenso tempo e atenção a tomar conta das suas barbas. Os assírios, os sumérios e os fenícios, todos deixavam crescer barbas luxuosas, longas e espessas. A característica mais distintiva das barbas mesopotâmicas era a maneira como elas eram meticulosamente trabalhadas e encaracoladas. Quanto mais alto estivessem na hierarquia mesopotâmica, maior e mais elaborada a sua barba era. 



Os Antigos Gregos


Os gregos antigos eram pessoas de barbas. Para eles, uma barba era sinal de virilidade, masculinidade e sabedoria. De facto, de acordo com Plutarch, nessa época quando começavam a aparecer os primeiros pêlos a um rapaz, era costume dedicar a primeira barba ao Deus do Sol Apolo num ritual religioso. Aos rapazes gregos não era permitido cortar o cabelo até as suas barbas começarem a crescer. 
Os homens gregos apenas cortavam as suas barbas durante o tempo de luto. Se uma lâmina não estivesse disponível, o homem em sofrimento resolvia arrancar a barba com as próprias mãos e queimava-o no fogo. Quando um homem morria, os seus parentes frequentemente penduravam os pêlos das suas barbas que tinham sido cortadas na sua porta.

Cortar a barba de outro homem era considerada uma ofensa séria, punível com multa e por vezes até podia dar cadeia. Estar sem barba era considerado vergonhoso! Os antigos gregos mandavam cortar muitas barbas como punição, por exemplo, os Espartanos cortavam metade da barba de um homem para indicar que ele tinha sido cobarde durante a uma batalha. 


Os Antigos Romanos




Para se distinguirem dos seus primos gregos, os antigos romanos era malta que gostava de andar de face limpa! A primeira vez que um rapaz fazia a barba era um evento importante na sua vida e era um ritual religioso elaborado. No dia do seu aniversário ele deveria barbear-se com os seus amigos e familiares a ver. Os pêlos eram guardados numa caixa especial e consagrado a uma divindade romana. Por exemplo, o Imperador Nero guardou os seus pêlos numa arca de ouro e pérolas. Alguns jovens esfregavam azeite nas suas faces ao longo dos seus anos de adolescência para que lhe crescesse uma barba espessa para a sua grande cerimónia. 

Antigas Tribos Germânicas



Nas fronteiras alemãs da Roma antiga, viviam tribos bárbaras que deixaram crescer algumas das barbas mais ferozes da história. Estas produziam um duplo efeito nos antigos romanos: medo e fascínio.
Esta tribo fez promessas de nunca cortarem as suas barbas até matarem e vingarem-se dos seus inimigos. Infelizmente as barbas nunca ajudaram e foram dizimados pelos bretões. 


Primeiros Cristãos




Enquanto os antigos judeus e muçulmanos eram ordenados a não fazerem as suas barbas, a aceitação delas entre os primeiros cristãos diminuía.
Por vezes as barbas eram vistas como símbolos de piedade. Outras vezes eram diabólicas. Um homem que decidisse dedicar-se a uma vida monástica teria de primeiramente submeter-se a ser barbeado e a ser observado pelos outros monges do mosteiro. Antes de ser barbeado, uma oração chamada benedictio ad barbam (benção da barba) era dita. É conhecida uma versão Abadia de Nossa Senhora de Bec em França.


Calculo que o vosso latim esteja meio enferrujado como o meu  e não vale a pena colocar aqui a oração, mas basicamente refere que o novo clérigo deveria seguir o exemplo do apóstolo Pedro. De acordo com a história não-canónica da igreja, antes de ser crucificado de cabeça para baixo, Pedro foi gozado e raparam-lhe a cabeça e a barba. Então, um jovem iniciante na Abadia de Bec resolveu partilhar esse episódio e fez o mesmo a ele próprio. Depois de retirar os pêlos e os cabelos, estes foram consagrados no altar. 
Depois deste ritual inicial, os monges eram submetidos  a um horário para se barbearem e raparem muito exigente. Numa convocação feita em 817 D.C, monges franceses decidiram que se deviam barbear e rapar uma vez de 14 em 14 dias, mas em certas ocasiões especiais antecipavam esse ritual.   


Como podem ver, a temática dos pêlos faciais não é de agora. Desde o inicio da humanidade que este ritual se tem imposto nas nossas sociedades e desde sempre o facto de teres ou não teres barba foi sempre conotado com algum significado e simbolismo. Ter barba não te dá super-poderes, não te faz mais viril nem te faz mais macho. Tal como o facto de não teres barba, não indicar que és mais limpo ou um homem mais espiritual. Desde sempre as civilizações se procuram distinguir umas das outras e nunca existiu uma lei universal a referir nenhum código de conduta de cuidados pessoais. 

Gostas de usar barba? Se calhar é ainda o bárbaro saxão que há em ti ou então ainda podes ser "arraçado" de algum filósofo grego. Eu no meu caso pessoal  devo ter descendência egípcia, é que não suporto ter um pêlo na minha face. Como não sou rico e não tenho  dinheiro para barbeiros pessoais, fico-me pelas nossas lâminas da Barbearia do Povo. Nunca desiludem e não as precisamos de as levar para o caixão.


David Madeira

(Governador)